5 de outubro de 2010

Ao ritmo da diferença

(Imprensa, Rádio e Televisão, 2ºano, 15 de Maio de 2009. Trabalho realizado em virtude da acividade organizada pelos alunos de Engenharia da Reabilitação da UTAD)


David baloiçava as rodas da cadeira e dançava!
A música, ele sente de outra maneira. A dança é sempre mais qualquer coisa.
A magia da música popular enchia-lhe os olhos e a alma…enchia-lhe o coração.   Foi nesse momento que percebi que tudo nesta vida é possível.
A tarde foi de festa, sorrisos, igualdade para todos. De muitas danças. Movimentos conjugados a uma só vontade: mostrar, que afinal, todos podem dançar.
A alegria, a liberdade de movimentos ainda que um pouco condicionados para alguns estava estampada nos rostos de todos os participantes do Workshop de dança levado a cabo pelo Núcleo de alunos de Engenharia da Reabilitação e Acessibilidade Humana da UTAD ( NAERA).
Segundo Abel Trigo, Vice-Presidente do Núcleo, a ideia deste evento foi inspirada no presidente do Núcleo, David Fonseca: «Ele é um dançólico anónimo, que sempre que pode não deixa de dar um pezinho de dança, sempre com gosto e muita paixão».
David é surdo, mas essa limitação nunca o impediu de dançar. E, por isso, foi um dos participantes mais animados do workshop. Sem barreiras. Sem impedimentos.
E o objectivo era mesmo esse, mostrar que qualquer pessoa pode superar os obstáculos. Sejam eles de que tipos forem.
E foram muitos os bailarinos amadores que quiseram juntar-se à festa e ao ritmo da música popular como o malhão e que encheram parte do primeiro piso do Centro Comercial Dolce Vita.
A música convidava todos a juntarem-se. O ambiente, desprovido de preconceitos, onde todos eram iguais, partilhava do mesmo ritmo e da mesma vontade de dançar.
O Dolce Vita ganhou o brilho que há muito faltava. Naquela Quarta-Feira tudo ganhou nova cor…a cor da igualdade.
«Dançar com a diferença», foi a frase de honra numa tarde que tão bem mostrou que tudo é possível, que ensinou a ver para além de tudo aquilo que imaginávamos estar ao alcance de todos… dançar de olhos vendados, perceber que as musicas tão normais podem ser encaradas de maneira tão diferente por aqueles que não enxergam como nós.
Carolina, estudante de engenharia da reabilitação ouviu às escuras por uns minutos.
«Sabes que podes ir para a frente e para trás, mas não te apercebes totalmente dos movimentos do corpo»
A dança vai para além de uma simples batida ou de um simples ritmo, a dança é exprimir artisticamente gestos coordenados onde se conjuga um misto de emoções, sentimentos, alegrias…
O Dolce Vita foi o palco, e todos os curiosos e todos os que quiseram participar serviram de mote para que se mostrasse que às vezes é a própria sociedade que coloca barreiras onde a própria deficiência não as tem.
Para Abel Trigo, «A música é sentir e as incapacidades não impossibilitam as pessoas de nada, qualquer pessoa pode dançar, pessoas de cadeira de rodas, pessoas cegas, pessoas surdas, inclusivamente pessoas com paralisia cerebral que dançaram e acima de tudo se divertiram».
E o sorriso de missão cumprida estampado no seu rosto não deixava negar tudo aquilo que afirmava.
«O balanço foi muito positivo, muito positivo mesmo, foi uma tarde fantástica. Houve escolas que trouxeram cá os alunos, que deram aulas aqui, aulas de reabilitação psicomotora. Foi objecto de estudo, tudo isto, também» dizia ainda Abel.
E a missão estava mesmo cumprida.
Esta foi uma entre muitas iniciativas que o Núcleo levou a cabo, uma das últimas foi o «Jantar às escuras», que convidou todos a comerem sem sequer saber onde estavam os talheres, ou terem sequer conhecimento do prato.
Surgiu com a ideia de sensibilizar toda a população para as dificuldades que um cego pode ter no seu dia-a-dia.
Para que todos aprendessem a ver para além daquilo que os olhos alcançam.
Aprender a ver com os sentidos…em sintonia.
Engenharia da Reabilitação e da Acessibilidade Humana começou a ser leccionado em 2007 e é a primeiro curso com este tipo de formação de raiz em toda a Europa.
Francisco Godinho, responsável pelo Centro de Engenharia de Reabilitação e Acessibilidade (CERTIC) e também coordenador do curso, realça a sua importância.
«É um curso que visa dar mais autonomia quer a pessoas com deficiência quer a idosos, uma área de população não tão restrita, que conta com 22% da população e que tem sempre tendência a aumentar».
Na realidade, o curso de Engenharia da Reabilitação é a profissão ou actividade orientada para a aplicação da ciência e da tecnologia na melhoria da qualidade de vida de populações com necessidades especiais, nomeadamente pessoas com deficiência, idosos e acamados em áreas como o acesso a tecnologias e serviços, educação, emprego, saúde e reabilitação funcional, mobilidade e transportes, vida independente e recreação.
É na verdade um projecto de louvar.
É já e 2010 que os primeiros alunos formados saem para o mundo do trabalho e segundo Francisco Godinho: «Vão disputar território com outros utilizadores».
«É preciso mostrar o lado mais humano do curso, e por isso mesmo os alunos tiveram todas estas iniciativas, desde o Jantar às escuras, a exposições de equipamentos, actividades de mobilidade e agora a dança»
Um cego, um surdo, um tetraplégico têm tanto ou mais direito.
Ensinam diariamente a todos que o que fazem, é feito ainda com mais valor.
E como dizia a D. Maria Adelaide Costa que assistiu de perto a toda aquela “confusão” instalada no Centro Comercial, «é sempre bom lembrarem-se de quem precisa.».

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