12 de dezembro de 2011

Uma doença chamada depressão




Daniela Gomes tem 28 anos e é Médica Interna Complementar de Medicina Geral e Familiar no Hospital de Vila Real. 
Licenciou-se recentemente no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar - Universidade do Porto.
Hoje falou-nos um pouco sobre a depressão e tirou todas as dúvidas!


Por Sara Carvalho



Sara Carvalho (SC): O que é a depressão?

Daniela Gomes (DG): O termo depressão gera enorme confusão diagnóstica entre os profissionais de saúde, por conta dos inúmeros significados que o termo tem – por exemplo, um estado afetivo normal, um sintoma, uma síndrome e uma doença.
Sentimento de tristeza é uma resposta normal e adaptativa do ser humano diante de situações adversas como perda, derrota, etc e pode ser um momento de reflexão e de preparação para novas ações no futuro e por isso não deve ser logo alvo de intervenção médica nem de diagnóstico psiquiátrico. Quando se fala em sintoma depressivo, este pode surgir nos mais variados quadros clínicos, como transtorno de stress pós-traumático, demências, esquizofrenia, alcoolismo, doenças clínicas, e pode também ocorrer como resposta a fatores psicossociais. A síndrome depressiva inclui alterações de humor como tristeza, irritabilidade, falta de capacidade de sentir prazer, apatia e outros aspectos, tais como alterações cognitivas, psicomotoras e vegetativas.
SC: Como se caracteriza?
DG: A principal característica de um episódio depressivo maior é o humor deprimido ou a perda de interesse ou prazer por quase todas as atividades e por um período mínimo de duas semanas. Para se confirmar uma depressão, o doente deve experimentar pelo menos quatro sintomas entre perda ou ganho de peso significativo, insónia, agitação ou retardo psicomotor, fadiga ou perda de energia, culpa e auto desvalorização, diminuição da capacidade de pensar e concentrar ou pensamentos recorrentes de morte, tentativa ou ideação suicida. O transtorno depressivo menor é semelhante à depressão maior, a diferença é o número de sintomas.
SC: Que tipos de problemas estão associados à depressão?
DG: Os sintomas depressivos podem surgir nos mais variados quadros clínicos, transtorno de stress pós-traumático, demências, esquizofrenia, alcoolismo, doenças clínicas, como referi há pouco. Também podem ocorrer como resposta a fatores psicossociais. A depressão tem vindo a ocupar uma posição de destaque no rol dos problemas de saúde pública e já é considerada a quarta doença médica mais dispendiosa para os hospitais porque os pacientes deprimidos passam mais tempo internados do que os pacientes com diabetes, hipertensão, artrite ou doença pulmonar crónica. É importante referir que os doentes depressivos têm tanta incapacidade funcional quanto os pacientes com doença cardíaca.
SC: A depressão tem cura?
DG: Sim, embora o termo correto seja tratamento, porque a qualquer momento pode haver recaídas. Para o tratamento antidepressivo deve ter-se em consideração que nós, os humanos, somos um todo incluindo dimensões biológicas, psicológicas e sociais. Portanto, a terapia deve abranger todos esses pontos e utilizar a psicoterapia, mudanças no estilo de vida e a terapia farmacológica. Há uma ideia errada e é importante que se  mencione que não se trata a "depressão" de forma abstrata, mas tratam-se pacientes deprimidos, contextualizados nos seus meios sociais e culturais e compreendidos nas suas dimensões biológicas e psicológicas. As intervenções podem ser na forma de psicoterapia de apoio, terapia interpessoal, comportamental, cognitiva comportamental, de grupo, de casais e de família. Há muitos fatores que influenciam o sucesso do tratamento e um médico deve debater todas as hipóteses com o seu paciente com vista a uma melhor qualidade de vida. 
SC: Na tua opinião a sociedade atual tem mais ou menos tendência para sofrer de depressões?
DG: Cada vez mais tendência, na minha opinião. O emprego, e também o desemprego, a idade da reforma, o stress.  A tecnologia, por exemplo, que nos permite ser mais eficazes no trabalho e que facilita a comunicação, também altera o ritmo de vida. Estamos mais acelerados. Não há paciência para esperar. Ao diminuir a nossa qualidade de vida, ficamos tristes, deprimidos. E esta tendência comprova-se em vários estudos. Segundo a OMS, esta síndrome, no ano de 2020, será a segunda doença que mais afetará os países desenvolvidos e a primeira em países em desenvolvimento.
SC: Está correto associar a depressão às grandes cidades?
DG: Não. O mais correto é associar a certas faixas etárias. Adolescentes e idosos, por exemplo. Adolescência é uma fase de desenvolvimento complicado pela pressão da sociedade para "caber num certo molde". Quem não é moldado é posto de parte, o que gera sentimentos de desvalorização própria, tristeza, baixa auto-estima. Nos idosos ou reformados, o sentimento de inutilidade predomina, e fica ainda pior quando doenças osteoarticulares, por exemplo, causam a perda de independência.
SC: Qual a tua opinião relativamente a tratamentos alternativos como a acupuntura ou hipnose para o tratamento da depressão?
DG: A mente é algo muito complexo e pouco compreendido e o poder da sugestão é uma ferramenta útil e perigosa. Honestamente, não acredito muito que  essas técnicas sejam muito úteis. Antigamente sangravam-se as pessoas para remover os tumores do fígado ou bílis. No entanto, está comprovado que o efeito placebo funciona. Como falei à pouco, acho que o factor stress é fundamental. Acredito que com tratamento de acupuntura e hipnose, consegue-se relaxar e talvez seja por isso que o tratamento funciona. Eu sou da opinião que se o doente se sente melhor então mal não faz.
SC: E sobre a quantidade de antidepressivos e ansiolíticos que são prescritos aos doentes com depressão? Concordas?
DG: Pois, essa é uma questão complicada. Os doentes têm tendência de se tornarem dependentes dos medicamentos antidepressivos. Acham que sem eles ficam piores. Basta que se esqueçam de tomar um dia o comprimido que já não dormem, ou o dia já não corre bem. Mas como objectivar algo subjectivo? Se a pessoa diz que se sente pior, não temos maneira de nos certificarmos disso. No entanto, há sempre o outro lado da moeda, porque há doentes que necessitam mesmo dos medicamentos. A questão para nós é mesmo como distinguir, e por isso optamos por tratar. No juramento de Hipócrates, jurei que Aplicaria os regimes para o bem do doente segundo o meu poder e entendimento, nunca para causar dano ou mal a alguém. Por isso, se a classe médica está ou não a tratar demais os doentes depressivos, isso continua em debate.
SC: Quais os conselhos que darias para que se evitem estados depressivos?
DG: Sem dúvida que eliminar as causas contribuintes como causas ambientais, agentes físicos e outras drogas capazes de causar a depressão, como o excesso de cafeína, é o caminho principal. Todos devem aprender a lidar com stress. Ter passatempos, praticar exercício porque liberta endorfinas  e estimula o nosso centro de prazer no cérebro, as mesmas endorfinas que são libertadas pelo orgasmo durante o sexo ou quando comemos chocolate. O meu grande concelho é que todos tirem uma hora por dia, de preferência depois do trabalho, para fazer algo que gostem, que dê prazer. Desde um banho de imersão, ler um livro, ver televisão ou um filme, dar um passeio a pé, que simplesmente tenham prazer nas coisas que façam.








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